(Fotografia de PC)
Fujo para o paraíso perdido, uma casa no campo, sonhando com longas horas de passeio pelos montes e vales, piqueniques na barragem, tardes de leitura debaixo de qualquer uma árvore, ou mesmo deitada no tronco que parece ter-se dobrado à medida do nosso corpo (será que ainda cabemos?). E os fins-de-tarde em cima do telhado, à espera que o sol se ponha para lá do pomar de peras, ao longe, muito longe, naquela linha imaginária! Para recolher à braseira e ficar a ver os filmes que alugámos no clube de vídeo da vila, para ficar a ler, para conversar com quem bate à porta, para dormir a sesta e repousar o corpo dos ares do campo ou aceitar um convite para jantar.
O acordar com o galo, com o sino da igreja, com a luz que teima em espreitar por entre as portadas que já não fecham bem, por umas janelas que deixam passar o frio da manhã! Os cães a saltar quando chegamos ao pátio, quando queremos é estar à mesa de um pequeno-almoço já preparado, o sumo da laranja apanhada no pátio, o pão que alguém nos deixou na porta e um primeiro banho de sol matinal ainda, de pijama. Está frio, às vezes chove e ficamos na lareira ainda apagada, da preguiça de ir buscar lenha, de ir acendê-la, mas onde já toca um disco de vinil, que nos obriga a levantar tantas vezes, para virar, para trocar! Enrolada numa manta da Serra da Estrela, daquelas que pica na pele, como se ainda fôssemos meninas e o fizessem as saias de fazenda! Deixo-me quase sempre adormecer, perder no periclitar da lareira, na preguiça de deixar o disco parado sem que ninguém o vá girar.
Sair de casa, só para ir à praça, à mecearia, buscar a fruta que não temos, os legumes que queremos saltear numa frigideira antiga, que pega sempre, para comermos no alpendre, sem pressas. No talho, a melhor carne, que servirá de jantar, talvez um churrasco, para quem quiser aparecer e sentar-se a uma mesa onde há sempre lugar para mais um, dois, os que vierem. E as noites de ginginha e cartadas na biblioteca, a meia-luz, onde acabamos muitas vezes zangados, entre tantas batotas, como se ainda fossemos meninos de escola e roubássemos dinheiro no Monopólio!
Esperar que a noite acabe e deixar que o amanhã chegue mais tarde, ficar numa ronha de pequeno-almoço na cama, visitas no quarto no alto da 'torre' para dois dedos de conversa, preguiçando num meio-dia ainda não levantado! E como demoram essas manhãs, como parecem eternas.
As tardes passam devagar, como se os ponteiros do relógio não andassem, nos saltos à praia, às vezes em demorados passeios à beira-mar, quase sempre terminados num fim de tarde de marisco e no voltar a casa com a certeza de que a felicidade é esta sensação e que amanhã ainda andará por aí!
Hoje é dia de partida. Malas feitas, é só esperar a hora de saída, o salto para o carro entre desejos de ainda ver o pôr-do-sol à beira-mar.