(Encontrada aqui)
À S., doze anos depois
Abandonou-te também a vida e largou-te na rua, a sustentar com o próprio corpo ainda menino, tão pequeno como o nosso, uma vida vulgar e infeliz.
Hoje, não sei onde vives, o que é feito de ti... mas, no outro dia, naquela rua fria, naquela sombra do outro lado da rua, quase tenho a certeza que eras tu. Não trazias mais o sorriso nem o brilho do olhar. Apenas esperavas, com ar exausto, que alguém te encontrasse, que alguém te levasse e te pagasse mais umas horas de vida.
À S., doze anos depois
Encontrei o teu olhar vagabundo por detrás do castanho luzidio dos teus olhos, aqueles que ainda lembro dos nossos anos de meninice. Já nesses dias trazias o olhar adulto, portal de um coração ainda menino. A tua pele escura e os modos em tudo diferentes dos nossos, mais bruscos, mais revoltos, pouco habituados às meiguices da infância que sabíamos não teres tido, traziam as marcas de uma história em que o 'final feliz' não parecia para breve. Eras a heroína de uma vida que cedo virias a perder, ao perderes-te pelos caminhos que não te souberam ensinar.
Abandonada no berço, criada entre tantas iguais a ti, menos bonitas, bem recordo, mas iguais na revolta, na mágoa e na vontade de largar tudo e fugir. Assim fizeste e logo te perdemos o rasto. Ainda te viram, anos mais tarde, de criança ao colo, ainda menina como nós, a pedir à porta da igreja. Quando cheguei, já não estavas lá. Vives fugitiva entre mundos, escondida dos que te querem apanhar e nada te souberam dar quando pediste. Vida cruel a tua, menina abandonada à sorte de quem te quisesse adoptar, pegar ao colo e tomar-te como filha. Mas tinhas o rosto escuro de mais, a pele quase negra e um jeito de cigana que dizias ser a tua má sorte.
Abandonou-te também a vida e largou-te na rua, a sustentar com o próprio corpo ainda menino, tão pequeno como o nosso, uma vida vulgar e infeliz.
Hoje, não sei onde vives, o que é feito de ti... mas, no outro dia, naquela rua fria, naquela sombra do outro lado da rua, quase tenho a certeza que eras tu. Não trazias mais o sorriso nem o brilho do olhar. Apenas esperavas, com ar exausto, que alguém te encontrasse, que alguém te levasse e te pagasse mais umas horas de vida.
7 comentários:
Proporcionaste-me um bom minuto de leitura, bem-hajas por isso.
Beijos e um bom fim de semana.
Ah!Depois de uma semana dedicada ao futebol, eis o menu para a próxima semana no "Regresso ao Eldorado":
* "Geno" dos Dexy Midnight Runners * As cassetes
* Pluto e Ron-Ron no Top Geração Tio Patinhas
* E, pela primeira vez na internet, a foto-tabu do autor do blogue ilustra a memória em "Quando eu era uma princesinha"!!
era ela, sofia?
gostei tanto do texto,tanto. hoje tocaste-me*
Lindo, Sofia!...
beijinho
olha que coisa mais linda, sofs.
quando publicares o teu primeiro livro convidasme para o lançamento, vale?
:)
faltou-me o tracinho em convidas-me... blhec
Disse-te quando me mostraste isto e digo agora para todos: é das coisas mais bonitas que já te vi escrever! Beijinho grande na barriga ;)
JP, ainda bem!
Já lá passo no teu cantinho dourado! Espero a foto da princesa!
Beijos
M, sabes de quem falo, não é verdade? Pois acho mesmo que era, tinha aquele sinal e tudo... mas olha, por cobardia, vergonha, não sei, não fui capaz de me aproximar!
JML, ainda bem que gostaste!
É uma história verdadeira.
beijinho
TCL, estarás convidada, mas só se pudeseres os tracinhos todos... LOL
beijos
Huck, tu sabias esta história, não é verdade? Gosto quando gostas!
beijos
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